Willa Cather
Ed. Códex
São Paulo, 2003
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“Tive uma intuição da relação entre as moças como aquelas da poesia de Virgílio. Se não houvesse meninas assim no mundo, não haveria poesia.” Willa Cather explicou dessa forma a gênese do livro que trata da vida de uma garota boêmia (tcheca, atualmente), Ántonia Shimerda.
Ainda menina, chegou com a família ao Nebraska, onde enfrentou o clima inóspito e a dureza da terra. O narrador, seu vizinho Jim Burden, passou a infância e a adolescência em Black Hawk, e partilhou com Ántonia aventuras e confidências. Viu-a trabalhar incansavelmente, ser infeliz no casamento, recomeçar a vida.
O livro é um tanto paradoxal, pois seu tom consegue ser poético e coloquial, mistura suavidade e crueza, parte de fatos corriqueiros para chegar a considerações metafísicas. Duas passagens, entre outras, ilustram essas características.
A primeira é dura, e poderia ser chamada “os noivos e os lobos”. Rússia. Planície gelada. A festa de casamento demora mais do que o previsto. A noite está avançada quando os trenós rumam de volta para a vila vizinha. No meio do trajeto, uma alcateia ataca. Um a um, os trenós são derrubados e seus ocupantes, devorados. Sobra o dos recém casados. O condutor mais forte e soturno sugere ao marido que lance sua mulher às feras, a fim de que consigam escapar. Ele recusa. Brigam, o marido perde, é jogado aos lobos; idem sua esposa. Quando o crime é descoberto, os condutores têm de fugir. Vão parar precisamente no Nebraska, perto de Ántonia. Anos depois, no leito de morte, o russo que jogou os esposos têm alucinações e vê lobos por todos os lados. O pai de Ántonia o consola. Ele morre em paz.
A outra passagem é lírica. Quando expulsos de um estado sulino, os mórmons, sem as esposas e filhos, vão à frente. Cruzam o Nebraska para chegar ao estado que os aceitou. No ano seguinte, virão suas famílias pelas mesmas estradas. Resolvem semear flores à beira do caminho, enquanto passam. Assim, as mulheres e crianças encontrarão nessa beleza acrescida o consolo para a dor do desterro.
Essa obra, enfim, é um mergulho na genuína América profunda. Ao enaltecer a vida simples e honesta da protagonista, dos seus familiares e amigos, ajuda na reflexão e assimilação de valores que talvez careçam de reflexão e assimilação.
Paulo Oriente Franciulli
Professor de Filosofia do Direito do IICS
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